25 de set. de 2010

Por que o Rio Grande do Sul é assim – parte VI



A revolução vinda de cima

“Revolução vinda de cima” é uma expressão leninista que procurou identificar o caráter da revolução burguesa na Alemanha de Bismark. No Rio Grande, os positivistas também fizeram uma revolução por cima. Embora o processo sulino não tenha tido o caráter reacionário como o apontado por Lênin na Alemanha.
Veja então que temos três modelos distintos de revolução burguesa: o modelo francês de 1789, uma revolução total, arquetípica, democrática e modernizadora em toda a sua expressão; o modelo alemão, reacionário (os de cima contra os subalternos), autocrático, e que operou a chamada modernização
conservadora; e o modelo rio-grandense de 1893 (não confundir com a guerra civil Farroupilha de 1835, que nunca foi uma revolução stricto sensu), autoritário, modernizador e progressista – mas sempre burguês.

A Constituição positivista pode ser classificada como de “tipo ideal”, que funda e orienta de fato e de direito uma nova ordem política e social. Ela “deu nascimento a um regime político único, tanto no Brasil, como no mundo”, como observa Targa. Assim, a transição capitalista na região meridional brasileira foi acelereda pelo episódio militar de grande violência política que praticamente esmagou os representantes do Estado  patrimonial, eliminando as aspirações da fração de classe mais atrasada de capturar o Estado para torná-lo comitê dos negócios pouco dinâmicos e macroeconomicamente subordinados da oligarquia estancieira e pastoril.

Se os maragatos federalistas-gasparistas, orientados pelo líder bageense Gaspar da Silveira Martins (“idéias não são metais que se fundem”, e muito ligado a Pedro 2º), tivessem vencido a revolução de 1893-95, o professor Maestri teme que o Rio Grande se transformasse caricaturalmente “numa grande Bagé”.

Pode-se imaginar o cenário desolador, contribuição guasca ao dantesco quinto círculo do Inferno:
- grandes latifúndios despovoados e decadentes,
- economia subordinada e sem dinamismo,
- regime pastoril de baixíssima produtividade,
- agricultura estagnada,
- indústria inexistente,
- contrabando crescente,
- aparelho de Estado impotente e desautorizado,
- contas públicas deficitárias,
- confusão promíscua entre público e privado,
- assembléia de representantes loteando o território em zonas de interesse
particularista,
- populações errantes perambulando em busca de trabalho e renda que jamais
encontrariam,
- infra-estrutura ineficiente ou inexistente,
- isolamento e heteronomia do Estado,
- miséria generalizada,
- riqueza escassa e concentrada,
- possíveis invasões estrangeiras pela fronteira,
- aglomerações urbanas como viveiros privilegiados de doenças e epidemias,
- educação pública zero,
- territórios inteiros tomados por bandoleiros armados,
- bandidagem social,
- anomia social e política,
- guerra civil prolongada,
- razias, saques e prática corrente de aniquilamento de comunidades inteiras,
- intervenção federal militar e civil, etc.

Ilustrações de Goya (1806) mostrando selvagerias que coincidentemente ele chamou de "Série Maragato". La Maragatería foi a região da Espanha de ondem migraram os futuros povoadores de parte do território uruguaio, daí a denominação dos maragatos federalistas rio-grandenses - muitos deles recrutados na Banda Oriental do Uruguay.

Texto de Cristóvão Feil (http://www.diariogauche.blogspot.com/)

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