28 de jun. de 2019

De Jamil Chade

GENEBRA – Em 20 anos percorrendo os corredores da ONU e de outras entidades internacionais, viajando com presidentes e indo a cúpulas, posso dizer que presenciei alguns momentos pouco nobres da política externa brasileira. Mas o que vi ocorrendo nesta quinta-feira nas salas de reunião das Nações Unidas, em Genebra, é diferente de tudo que essas duas décadas de escola me apresentaram. Ainda que eu mesmo tenha sido um crítico do silêncio de Lula sobre os abusos aos direitos humanos no Irã, em Cuba ou na Coreia do Norte, ainda que Dilma Rousseff tenha errado ao manter seu apoio irrestrito ao governo de Maduro, ainda que o PT tenha promovido seus próprios quadros e tenha deixado grande nomes da diplomacia nacional encostados em consulados irrelevantes pelo mundo, ainda que a expansão das empresas brasileiras pelo mundo tenha ocorrido em parte com propinas, havia uma coerência mínima em relação à tradição da diplomacia nacional. Em qualquer continente e dentro de todas as entidades internacionais, o Brasil era reconhecido por seu esforço para construir pontes, dialogar e criar uma situação em que se apresentaria como um interlocutor. Em algumas situações, essa estratégia funcionou. Em muitos outros, não. Mas havia uma lógica que remontava ao DNA da diplomacia de Rio Branco. A soberania seria defendida por meio do fortalecimento da paz, pelo diálogo e da defesa irrestrita do sistema multilateral. E não por sua destruição. Hoje, o Brasil abriu mão dessa coerência e dessa tradição. Transportando para a política externa valores ultra-conservadores do grupo no poder, desconsiderando a multiplicidade da população brasileiras e ignorando seus compromissos internacionais, o Itamaraty passou a colocar em prática uma diplomacia ideológica-religiosa. E que passou a minar o consenso até mesmo dentro do Ocidente. Nos últimos dias, diplomatas receberam claras instruções de Brasilia para vetar nos textos e resoluções da ONU qualquer uso da palavra "gênero", termo reconhecido em tratados internacionais assinados pelo próprio governo brasileiro desde os anos 90. Também foram instruídos a fazer um ataque a qualquer indicação de que uma interpretação errada de uma religião possa ser um obstáculo à igualdade entre homens e mulheres. Ou seja, a manipulação de uma religião jamais deve ser considerado como um problema. Também atacaram o conceito de direitos reprodutivos e, claro, lideraram um combate feroz a qualquer referência nos textos que eventualmente pudesse dar brecha a uma suposta análise positiva do aborto. Não, os trechos propostos originalmente pelas resoluções não defendiam o aborto. Isso estava apenas na forma pela qual o governo brasileiro as interpretava. Com esse arsenal, la foi o Brasil falar nesta quinta-feira da defesa dos direitos humanos e da proteção à mulher. Hoje, resoluções seriam negociadas na ONU para que, em julho, os textos possam ser submetidos ao voto. Mas o que presenciei foi um profundo constrangimento. Indignação Enquanto os diplomatas brasileiros pediam a palavra e começavam a listar todo vetos sobre os trechos das resoluções, o que se via na sala era uma mistura de espanto, ironias e incompreensão por parte das delegações estrangeiras. Num canto, representantes do Uruguai não disfarçavam o susto, enquanto outros rapidamente colocavam as placas com o nome de seus países para que pudessem intervir, contra as propostas brasileiras. Um representante da UE ria, enquanto outro de sua mesma delegação suspirava diante do que escutava. Por mensagens de telefone, delegados na sala trocavam impressões sobre como reagir ao Brasil. Entre as ongs, os comentários ao pé do ouvido beiravam a revolta. Na medida que os vetos anunciados pelo Itamaraty continuavam, a surpresa ganhava uma conotação de indignação. Num dos cantos da sala, vi como uma diplomata, irritada e certamente sem instruções de sua capital, levantou sua placa com energia para frear uma proposta do governo de Bolsonaro. Afinal, aqueles textos não eram novos. Nos últimos anos, foram sempre aprovados por consenso e apoio explícito do Brasil. Nem mesmo os novos aliados de Bolsonaro – Chile e Israel – toparam a guinada brasileira ao obscurantismo. Os representantes de ambos os países fizeram questão de pedir a palavra para dizer que não aceitavam o que o Brasil sugeria. Mas não estávamos sozinhos. De forma surpreendente, quem passou a apoiar as propostas brasileiras eram justamente aqueles estados que são acusados de ainda viver com regras medievais para suas mulheres e de cometer atrocidades a quem não segue um dogma religioso. Fomos aplaudidos pela Arábia Saudita, Paquistão e Bahrein. Decidi sair da sala. Fiquei tentando me colocar na pele daqueles diplomatas de carreira do Brasil que foram obrigados a ler tais instruções. No corredor, me deparo com outro diplomata europeu que faz questão de se aproximar e me comenta: sabe que o regime de Duterte diz que vocês brasileiros estão com eles em uma resolução para impedir que os massacres nas Filipinas sejam investigados? Num dos dias mais constrangedores que já presenciei na ONU para o Brasil, vi apenas um padrão: um país rasgando sua história, enterrando sua reputação, ganhando a imagem de antipático e se alinhando com os valores dos países mais retrógrados de nosso planeta. Nos próximos dias, existe uma enorme chance de o Mercosul fechar um acordo histórico com a UE e, se isso ocorrer, o governo vai correr para anunciar que o tratado é um sinal da aceitação do Brasil de Bolsonaro no mundo. Não, não é. O que a Europa quer é mercado e vender, sem perder espaço para Trump. E por isso está fechando essa negociação. Mas, no âmbito político, a pressão continuará e governos vão ter dificuldades em sair na defesa das posições do Brasil. Pelas demais salas da ONU, indígenas brasileiros protestavam, ambientalistas denunciavam, palestinos questionavam a posição do Brasil em Jerusalem, relatores da ONU falavam dos perigos da tortura no País e um governo acuado tentava dar respostas vazias sobre o suposto compromisso do governo Bolsonaro. Tudo isso em um só dia. A embaixadora do Brasil na ONU? Ah, ela estava acompanhando a visita do ministro de Ciências, em visita à cidade. Achei que já tinha visto de tudo. Mas meu engano foi pensar que o constrangimento não estava terminado. Já era o início da noite e estou deixando a sede da ONU quando sou parado para uma relatora especial da entidade que, me segurando no braço, pergunta: o que está ocorrendo no Brasil? Jamil Chade

18 de jun. de 2019

E agora, Bolsonaro? Matéria publicada hoje, 18/06, na Folha, noticia que empresários brasileiros teriam comprado software e pacotes de envios de WhatsApp em massa, em prol da campanha de Bolsonaro, de uma empresa espanhola. Diante disso, surge uma série de perguntas. Tento aqui trazer alguns esclarecimentos, com as informações até o momento disponíveis. 1. Se comprovados os fatos, essa prática é ilegal? Sim. A legislação eleitoral brasileira exige que todas as atividades feitas em prol de uma campanha – incluindo a difusão de mensagens por quaisquer meios – sejam custeadas com recursos da conta corrente eleitoral e, portanto, constem da prestação de contas. A única exceção a esta regra é a permissão de que pessoas físicas – cidadãos – façam despesas em até aproximadamente R$ 1.000,00 (ao longo de toda campanha) em benefício de uma candidatura. É o caso de alguém que faça uma placa para sua casa, reúna amigos para uma reunião política, etc. Empresas, por outro lado, são absolutamente proibidas de contribuírem para campanhas eleitorais, seja por doações diretas ou pelo pagamento de despesas de qualquer valor, conforme decidiu o STF na ADI 4650. 2. E qual a pena prevista para essa ilegalidade? A depender da gravidade dos fatos – um conceito relativo, a ser apreciado pela Justiça Eleitoral, que abrange o peso que a conduta teve no desenrolar da campanha – pode-se configurar abuso de poder econômico, punido com a cassação da chapa vencedora – presidente e vice-presidente – além da decretação da inelegibilidade de quem for considerado responsável pelas ilegalidades. É o que está previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90. 3. Mas a matéria diz que aparentemente Bolsonaro não sabia do esquema organizado por empresários. Ainda assim ele pode ser punido? Sim. Para que seja cassada a chapa não é necessário demonstrar dolo, culpa ou mesmo conhecimento por parte dos candidatos. Basta que se reconheça terem sido eles beneficiados pelos atos considerados ilegais. Se a Justiça Eleitoral entender que não houve conhecimento ou participação direta, cassa-se a chapa, mas deixa-se de aplicar aos candidatos cassados a pena de inelegibilidade. 4. Já se passou mais de seis meses da posse de Bolsonaro. Ainda assim é possível buscar a punição na Justiça Eleitoral? Sim. De fato, a legislação prevê prazos curtos para que sejam questionados os resultados das urnas. Neste caso, contudo, a chapa de Haddad e Manuela, bem como o PDT, ajuizaram Ações Judiciais Eleitorais – este é o nome da ação que busca apurar o abuso de poder econômico nas eleições - ainda dentro do prazo, o que permite à Justiça Eleitoral analisar os novos indícios agora revelados. 5. Mas não se aplica a jurisprudência da ação ajuizada contra a chapa Dilma/Temer, que foi julgada improcedente exatamente por não terem sido aceitos os indícios que apareceram tempos depois? Não. As situações são juridicamente diferentes. Entendeu o TSE, no caso Dilma/Temer, que a coligação de Aécio Neves tentou alterar o que chamamos “causa de pedir” da ação depois do prazo máximo permitido. “Causa de pedir” é o motivo pelo qual se faz um pedido na Justiça. Imagine-se que a pessoa A entra com uma ação contra B, pedindo indenização decorrente do vazamento que afirma haver do apartamento de B sobre o de A. Passado um tempo, A diz ainda querer a indenização, mas que ela decorre na verdade do fato de que B bateu no carro de A enquanto tentava manobrá-lo na garagem do prédio. Se já houver transcorrido o prazo para ajuizamento de ações de indenização, não é possível aceitar o pedido de A, uma vez que a ação versava sobre outra coisa originalmente (vazamento). Ainda que o pedido seja o mesmo – uma indenização -, o motivo por trás é outro. É o que se tem aqui. No caso Dilma/Temer afirmava-se no início ter havido uso de caixa 2, ou seja, recursos que não passaram pela contabilidade de campanha. Posteriormente, surgiram indícios – na Operação Lava Jato -, que recursos oficiais, que passaram, portanto, pela conta de campanha, eram fruto de corrupção. Ainda que o pedido fosse o mesmo – cassação da chapa – o motivo havia mudado: de caixa 2, no início, para questionar a origem ilegal dos recursos que entraram no caixa 1. Daí o motivo pelo qual, corretamente, o TSE entendeu que não era possível averiguar aqueles novos fatos. Agora a questão é diferente, pois a chapa Haddad/Manuela e o PDT ajuizaram ações – dentro do prazo – questionando exatamente o fato de que empresários teriam custeado, por fora, o envio de mensagens em massa por aplicativos. Não há alteração da “causa de pedir”, apenas surgiram novos elementos para reforçar a acusação contida na ação. É possível, assim, ao menos em tese, que estes indícios sejam trazidos à Justiça Eleitoral. 6. E quanto tempo leva para o TSE julgar a ação? Ainda que a lei traga prazos para o julgamento deste tipo de ação, é fato que a Justiça Eleitoral costuma demorar mais tempo, especialmente quando há necessidade de produzir provas complexas, como no caso. Não é possível fazer uma previsão. 7. E o que ocorre se a ação for julgada procedente e a chapa for cassada? Quem assume? Há novas eleições? Se a chapa for cassada, caem Bolsonaro e Mourão. A chapa é considerada “una e indivisível” para fins eleitorais. Com isso, anula-se as eleições presidenciais de 2018 e convoca-se novas eleições apenas para os cargos de presidente e vice-presidente. Essas eleições serão diretas – ou seja, com os votos de todos os eleitores -, se isso ocorrer até o final de 2020. Serão indiretas – votando apenas os membros do Congresso Nacional -, se a cassação acontecer depois de 1º de janeiro de 2021. Com o afastamento do presidente e do vice-presidente, assume temporariamente o presidente da Câmara dos Deputados, atualmente o Dep. Rodrigo Maia. O prazo que a lei prevê para a realização das novas eleições é de até 90 dias contados do afastamento dos titulares. 8. Existe a chance do segundo colocado, Fernando Haddad, assumir a presidência automaticamente? Não. Como dito, a regra atual prevê que sempre que houver a cassação da chapa majoritária, convoca-se novas eleições. Fernando Neisser, advogado eleitoralista, mestre e doutor pela Faculdade de Direito da USP.

16 de jun. de 2019

Mídia foi parceria da delinquência de Moro, diz Janio de Freitas

O jornalista Janio de Freitas avalia que os crimes cometidos por Sergio Moro e sua equipe na Lava Jato não teriam sido cometidos sem o aval da imprensa. “Nada aconteceu ao acaso nesta etapa fúnebre do nosso fracasso como país. A partir de tal premissa, é preciso dizer que os atos delinquentes de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros da Lava Jato só puderam multiplicar-se por contarem com o endosso de vozes e atitudes que deveriam eliminá-los. É preciso, pois, distribuir as responsabilidades anexas à delinquência, não pouco delinquentes elas mesmas”, ... “É preciso dizer que a imprensa, incluído o telejornalismo, foi contribuinte decisivo nas ilegalidades encabeçadas por Sergio Moro. Aceitou-as, incensou-o, procurou tornar o menos legíveis e menos audíveis as deformações violadoras da ordem legal e da ética judiciária. Os episódios de transgressão sucederam-se, ora originários de Moro, ora do ambiente de fanatismo imperante entre os procuradores. Com o cúmulo do desatino e do extemporâneo no espetáculo de Deltan e da psicótica rosácea de acusações ao alvo de sua obsessão”, aponta ainda. “É indispensável reconhecer que Gilmar Mendes esteve certo nos seus ataques a procedimentos de Sergio Moro e dos procuradores da Lava Jato. Sem subscrever suas pesadas palavras, o sentido do muito que disse, com desprezo de vários colegas, foi verdadeiro. Os que apontaram as condutas transgressoras da Lava Jato foram muito atacados, mas eram os que estavam certos. Está provado, com as vozes dos políticos Sergio Moro e Deltan Dallagnol”, lembra ainda Janio. Fonte: Brasil 247

11 de jun. de 2019

Moro, Dallagnol e tudo o que eles representam, são criminosos.

Texto do Gustavo Conde

Vou fazer que nem o Lula e dizer: "deixa eu falar uma coisa pra você".

(Sempre quis fazer isso).

O dado concreto é que o The Intercept é vacinado. Eles conhecem o nosso jornalismo de milícia.

Um lote de vazamentos com Moro e Dallagnol em dança promíscua jamais seria suficiente para mobilizar a atenção da nossa imprensa, quando mais a 'recepção narrativa' dessa imprensa.

Mas um conjunto de lotes? Aí a conversa é outra.

Não é à toa que Glenn Greenwald tem um Pulitzer nas costas.

No Brasil, praticar o jornalismo real, investigativo, exige cifras de inteligência e caráter adicionais.

O drible da vaca dado pelo "Interceptador" (que nome para um site!) é da ordem do inconsciente e da ciência econômica (sic): a projeção - de futuro - é mais forte simbólica e retoricamente do que o posto na linha do horizonte.

Em língua de gente: pouco importa o lote vazado na histórica noite de 9 de junho de 2019. O que conta mesmo é o volume gigantesco de conversas que o site diz ter em mãos - e o respectivo conteúdo 'estarrecedor'.

O que vimos ontem foi só uma prévia.

É o aperitivo desta que anuncia ser a maior fraude judicial-eleitoral de todos os tempos, levando-se em conta não apenas o Brasil, mas o próprio mundo (que não é plano e dá voltas).

No Brasil, produzir jornalismo investigativo exige essa artimanha: é preciso garantir a continuidade e a sequência narrativa, senão o brasileiro não 'pega'. Nem no tranco.

É o nosso novelismo aplicado, décadas de corrosão cerebral com novelas intermináveis e idênticas umas às outras (com os mesmos atores, diretores, iluminação etc).

Uma pergunta adicional, no entanto, ainda me faz coçar o calcanhar aflitivo das indagações: por que a fonte vazou essa montanha de diálogos criminosos para o The Intercept e não para a imprensa comercial?

Precisa responder?

Precisa.

Porque resta evidente, olimpicamente evidente, que a imprensa comercial denunciaria a fonte e a entregaria às "autoridades".

Esse é o jornalismo de cativeiro praticado no Brasil.

Tanto mais interessante também é a nossa subserviência à cultura anglo-saxã (no quesito 'elite-informação').

O verniz que um veículo com título em inglês dá ao escândalo Moro Leaks é uma sinuca de bico para a nossa classe média tosqueada pela indigência cognitiva de bolsos e de minions.

A própria imprensa vassala caiu nessa armadilha. É bonito estampar o nome "The Intercept" no frontispício das matérias subdesenvolvidas brazucas que querem ser sempre made in USA.

Afinal de contas, isca não é só minhoca, é também um miolo de pão adocicado.

O The Intercept não tem apenas - e é bom que se diga - ambições domésticas com essa matéria.

É uma matéria para ganhar o mundo, para romper fronteiras e abrir um flanco de resistência jornalística nas fraudes eleitorais - seguidas de lawfare - que ainda estão por vir.

O conceito de 'Wiki Leaks', "vazamentos rápidos" em tradução livre, depende, paradoxalmente, de uma duração longa - a duração da desova mesma dos vazamentos, a conta gotas e a seleções cirúrgicas e controladas.

Porque assim, dá-se a dimensão de instituição ao jornalismo praticado e impõe-se a 'fiança do sentido' (a verossimilhança narrativa).

Contra as notícias rápidas e rarefeitas, só pílulas de tempo denso, recheadas do óbvio ululante. Ou: todos já sabiam de tudo isso, mas era um 'saber' ainda 'marginal'.

Sobre esse já dito e já sabido, é preciso enunciar mais uma cifra de percepção fugidia.

Como era de conhecimento público e notório que Sergio Moro e Deltan Dallagnol sempre foram dois criminosos a serviço da perseguição política, é-nos assaltada a surpresa diante de tal compêndio de vazamentos.

A reação fica entre o deboche e a indignação, o que é um dilema terrível para quem precisa de sinalizações concretas e claras de que a civilização e a justiça ainda existem.

Um desafio a mais sem dúvida (mas quem disse que seria fácil?).

Resta acompanhar e torcer para que o The Intercept siga seu destino de recolocar os pingos nos is neste país.

Mais um Pulitzer para Glenn Greenwald seria pouco.

(Gustavo Conde)

8 de jun. de 2019

A cultura do ódio....


Da psicanalista Helenice Rocha:

"É a cultura do ódio a responsável pelo país sombrio e miserável que estamos habitando.
Quem elegeu Bolsonaro? O ódio. O ódio ao PT, à velha política, à esquerda, mas ódio.

Bolsonaro inventou o ódio no Brasil? Óbvio que não, mas ele o legitimou como nenhum outro presidente o fez.

Bolsonaro prega o ódio diariamente, sem nenhum pudor, às claras. Nem no regime militar vimos isto. Naquela época, na maior parte do tempo, o ódio se recolhia aos porões.

Quando Bolsonaro exaltou publicamente, na casa do povo, um torturador que colocava baratas e ratos vivos nas vaginas das mulheres e não foi preso ali, naquele momento, ele mandou um recado: doravante poderemos exercer nossa sordidez sem nenhum verniz.

E assim ele se tornou presidente.

Quando o mandatário de uma nação, a figura que ocupa o cargo mais respeitável de um país prega o ódio sem trégua, ele legitima a expressão da fúria para todos.

No texto “psicologia das massas” Freud nos adverte sobre o perigo da ascendência do “líder louco” sobre a massa. Foi assim na Alemanha de Hitler, na Itália de Mussolini e na Espanha de Franco.

No Brasil de Bolsonaro, o caso do rapaz que espancou a amante grávida e depois suicidou-se é emblemático. É a expressão do ódio em suas formas mais caricatas.

É emblemático por vários motivos: porque no país do bolsonarismo as mulheres são odiadas; porque o rapaz chamava as feministas de cadela na música que cantava em homenagem ao presidente e porque como tantos jovens no país governado por este pulha, o rapaz enlouqueceu e se matou.

É emblemático porque os comentários dos eleitores do presidente nas redes sociais vão desde a esculhambação da moça ora hospitalizada, até a teoria de que o rapaz não se matou, na verdade “ele foi morto por alguém da esquerda.”

E enfim, é emblemático porque o presidente, ao  expressar em seu twitter as condolências à família do rapaz, não fez uma menção sequer à vítima e sua família, da mesma forma que até hoje não deu um pio sobre outras mortes que chocaram o país.

Bolsonaro sempre foi da ralé. Enquanto vivia no submundo da ralé militar e da ralé política, foi nocivo ao país que servia, sem dúvida, mas era um “rato de porão”. No momento em que se tornou presidente com 57 milhões de votos, saiu da ralé e escancarou o que excita seus defensores: o ódio.

Bolsonaro ama as armas, as milícias, a burrice, os homens e as mulheres violentos.
Ele odeia a educação, a arte, a sexualidade, a saúde e o meio ambiente.

Somos hoje um país a beira de um colapso econômico e social. Muitos países já viveram esta experiência no pós guerra e se recuperaram com dignidade.

A guerra que agora vivemos é a da insensatez, da mediocridade, da boçalidade, da estupidez e da ignorância.

Somos mais de 200 milhões nas mãos de um crápula que não economiza na incompetência, desprezo e sadismo que constitui sua verdadeira essência.

Mas somos mais de 200 milhões e serão exatamente aqueles que Bolsonaro odeia que vão levantar este país uma vez mais pra fazer com que a pestilência que hoje envenena a todos volte para os porões de onde nunca deveria ter saído."

9 de abr. de 2019

Jânio de Freitas: com prisão de Lula, efetiva-se o que se chamaria o Projeto Lava Jato




Publicado em 8 abril, 2018 3:06 pm
Da coluna de Jânio na Folha.

A pressa do juiz Sergio Moro em formalizar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai além de sugerir as urgências de um anseio pessoal. Dá reconhecimento factual às já distantes percepções do que seria, e se consuma, o roteiro judicial e político da Lava Jato. A maneira como esse roteiro se fez cumprir será polêmica ainda por muito tempo, mas não tanto quanto o rastro de fúrias retrógradas e divisionistas do país.

É bastante significativo que o clímax do roteiro coincida com a missa por Marisa Letícia. Sergio Moro sabe, Deltan Dallagnol e seus companheiros de Lava Jato sabem, a Polícia Federal e os ministros do Supremo Tribunal Federal sabem o que foram o papel de Marisa Letícia e o não-papel de Lula da Silva nos assuntos do sítio e do apartamento (este, até recusado pelo ex-presidente, como consta do processo).

Tudo como a estrela de plantas vermelhas no jardim no Alvorada. Na Lava Jato, a única beleza está no silêncio com que, em seus depoimentos e no processo todo, Lula preservou a pessoa e depois a memória de Marisa Letícia, vítima da própria ingenuidade.

Paga por ela e pelo ex-presidente.

Por ingenuidade, a ministra Cármen Lúcia nada pagará, jamais. Entra para a história do Direito por sua adoção de um método original, quase um truque de carteado trapaceiro, para decidir no tribunal em favor de sua opinião.

(…)

Mais difícil ou impossível é entender uma juíza que vota contra o que diz ser sua opinião. Assim faz a ministra Rosa Weber, na preferência declarada por acompanhar as maiorias manifestadas no tribunal, mesmo se delas discorda.

Ora, o único sentido em integrar o Supremo é a tarefa de expor elaborações e conclusões jurídicas pessoais, para confronto decidido com os pares pelo voto.

Efetiva-se o que, em linguagem atualizada, se chamaria o Projeto Lava Jato. E o que esperar? Não se tem a menor ideia de para onde estamos indo.

(…)
Bob Fernandes